quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Nostalgia


No dicionário: «nostalgia: ... Do gr. nóstos, "regresso" + algos, "dor"»

Nostalgia foi o que Angela sentiu aquela tarde quando pegou a escada e foi subindo os degraus um a um... lá em cima do armário estava a bolsa. Era uma bolsa de viagem onde ela guardava as recordações de um antigo e mal-resolvido relacionamento... Fazia tempo que ela não abria este armário, não olhava a bolsa, não mexia em seu interior, justamente para evitar sentir a dor e a saudade que as fotos, cartas, bilhetes e todo o seu conteúdo lhe fazia lembrar ... Aquele fora o relacionamento mais importante que ela tivera, o mais intenso, o mais marcante, e ocorrera justamente na melhor fase de sua vida... E, de repente, ao se separar de Ele, não só deixou pra trás uma pessoa importante, como também, uma fase intensa de sua vida foi parar na gaveta, na bolsa, no esquecimento.... Tudo aquilo que ela vivera, vivera compartilhando com ele... E ao partir, ele levou aquilo tudo junto... Eram momentos só deles.... e agora, parecia que aqueles momentos não existiam mais. Era tudo tão triste... Esta separação já fazia mais de ... nossa, 20 anos!!! Eles estavam separados há quase vinte anos e ela ainda não conseguira esquecê-lo..... Parecia tudo tão presente...

Quando Angela deu por si, estava ao pé da escada, sentada no chão, encostada à parede, joelhos dobrados, queixo apoiado nas mãos, o pensamento longe... Fechou os olhos e parecia estar lá... Ouvia as folhas das árvores balançando ao vento .... o murmúrio de vozes distantes.... um carro chegando, os pneus rodando sobre o cascalho no estacionamento em frente à sua janela.. parando... a porta se abrindo.... a porta se fechando... e o coração de Angela aos pulos... a respiração ofegante ... Passos no cascalho... Este som, este ritmo, era Ele que chegava ... E ela seria capaz de reconhecê-lo ... sempre... até de olhos fechados, assim, como estava agora... Ela lembra do hábito que Ele tinha, ao chegar, de chamá-la à janela, como Rapunzel... Ela então abria a porta do quarto e esperava que ele desse a volta no estacionamento e entrasse por ela... Lá dentro, ela o esperava.. um sorriso, um beijo, um abraço... muitos carinhos... e um olhar... Ahhh, na verdade, não era um olhar, mas o olhar. Ele tinha aquele olhar todo especial quando olhava para ela. Era olho no olho. Era um olhar que sorria, que brilhava, que ao mesmo tempo, fazia com que ele parecesse um menino puro, ingênuo, doce, carinhoso... E ele era tudo isso. E quando olhava daquele jeito para Angela, ela se sentia iluminada... Ela se sentia única e amada. Ela se sentia dele e sabia que Ele era dela, só dela. E que no coração de Ele não havia espaço para mais ninguém. E que o olhar de Ele não olharia para mais ninguém daquele mesmo jeito.

Esta doce lembrança fez com que um sorriso brotasse em seu rosto... acompanhado de duas lágrimas que rolaram devagar e silenciosamente ..

Não! Angela respirou fundo, enxugou o rosto, levantou-se e fechou a escada. A bolsa ainda iria permancer lá, intocada, por mais algum tempo. Quanto tempo? pelo tempo que fosse necessário. Por enquanto era impossível remexer em tantas lembranças dolorosas. Por várias vezes Angela tentou amar outros homens, entregar-se a outras paixões, outros desejos, construir outros relacionamentos, mas, que nada.. Ele parecia estar sempre tão presente, embora tão distante fisicamente... Ele estava reamente longe: apaixonara-se, constituíra família, outro emprego, outro endereço, enfim, outra vida... Mas ela, não. Ainda ali, presa àquelas lembranças que mal conseguia tocar. Ainda era cedo pra mexer nesta ferida. Exteriormente, parecia cicatrizada, mas por dentro ainda doía, e muito.

By Barbarella

4 comentários:

Ricardo Rayol disse...

Cicatrizes podem doer, incomodam, nos lembram das besteiras que fizemos. 20 anos é tempo suficiente para alguém mudar, e muito.

Unknown disse...

Eu disse que iria navegar um pouco pelo seu blog. Muito bem feito, imagens interessantes, que chamam a atenção.
Eu me pergunto, o que fez vc fazer medicina veterinária?...rs...
Qta coisa deve ter nessa cabeça, e acho curioso a vontade de certas pessoas de exporem suas idéias, registrarem suas opiniões.
Esse texto da barbarella é muito engraçado. Qto de auto-biografico tem nele?...rs...

Armando

"Roberta" disse...

hum...
mmmm MISTÉÉÉÉRIOOOOOooo

A pergunta que não quer calar...
será que há algo de biográfico neste texto?
será 100% ficção?
terá sido inspirado em fatos reais?
ou terá sido só um delírio imaginário buscando atiçar a imaginção do leitor commpelindo-o a crer que poderia ter sido uma situação real??

hummmmm....

Anônimo disse...

A vida inteira que podia ter sido e que não foi. (...) A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

Quem nunca viu ou sentiu algo semelhante é porque não viveu. Permaneçamos nós com a dúvida sobre a verossimilhanças! :)
Gostei dos escritos, Barbarella, e ainda pelo modo como fui trazido!

De um certo Quadrado